-Para se viver, precisa-se saber
quem se é? – eu pergunto.
Ninguém me responde.
Alguns até gaguejaram. Tossiram 2x.
Palavras ininteligíveis foram sussurradas na 5ª fila.
O que eu realmente esperava? Se a
pergunta era minha e a resposta também?
Que alguém viesse me salvar? Que do
estrangeiro enviassem -para mim- um manual de instruções em 6 línguas? Que da
coxia soprassem minhas falas?
Não será assim.
E eu sei. Eu sempre soube.
Então, por que o espanto?
E esta tristeza de onde vem?
Passar concreto no vazio do peito é
medicalmente indicado?
E vago por livrarias em busca do
tal livro de respostas, calmamente, passando pelas mais variadas secções.
Evitando, é claro, os de auto-ajuda. São óbvios e comercialmente nocivos.
Alguém me contou. A auto-ajuda procuro na prateleira “Drama”.
E com este gosto de injustiça na
garganta, o que faço?
Minha Vó indicaria um gargarejo de
água morna com sal.
Cura tudo. Se não, uma colher de
mel pra arrematar. Nunca falha.
Escuto o silencio.
Fiz perguntas demais.
- Sempre escutei que era
anarquista.
- Não era comunista? Retrucou outro.
- Era algum “ –ista”.
-Não, facista era o Tio. E o avô, adultero. A
prima foi puta. E o cunhado ladrão.
-Sem pai. Nem mãe. Sem eira. Nem beira.
Tranquei a porta. Da linha de lá,
não me interesso mais.
Ainda estou curando meus ossos;
quebrados em 45 lugares. De 20
metros de altura, no trapézio da vida, fiz duas
cambalhotas perfeitas e me joguei no ar.... As mãos da minha dupla de numero
não vieram.
Eu vi o chão se aproximar e fechei
os olhos. A dor veio só depois que o efeito da adrenalina tinha passado. E o da
morfina, ainda nada.
Em declaração a imprensa, minha
dupla disse: “No comments”.
Sem comentar ainda, quando as luzes
se apagaram, ela deixou escapar:
“Não trabalho com insolentes que
querem brilhar mais do que eu. O Show é meu”.
Que assim seja. Mas seria pedir
muito, a decência, de me avisar que o número, dessa vez, acabava diferente?
Comigo no meu próprio sangue? Ou você não se lembra que o cartaz lá fora da
tenda dizia: EXTRA EXTRA SEM REDES DE SEGURANÇA!!!
O desespero da audiência é ouvido. Alguns
gritos, revolta.
-Tadinha caiu, e ela era tão boa.
-Se espatifou, melhor...
-Duro de ver. Gostava dela. Qual é
o próximo número? O mágico?
-Não, a mulher barbada. Vou comprar
pipoca pra este.
Nesse show de horrores e maravilhas
já não quero mais pertencer ao menu.
A cortinha se fecha.
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