terça-feira, 14 de agosto de 2012

Fragmento: Cai o pano





-Para se viver, precisa-se saber quem se é? – eu pergunto.
Ninguém me responde.
Alguns até gaguejaram. Tossiram 2x. Palavras ininteligíveis foram sussurradas na 5ª fila.

O que eu realmente esperava? Se a pergunta era minha e a resposta também?
Que alguém viesse me salvar? Que do estrangeiro enviassem -para mim- um manual de instruções em 6 línguas? Que da coxia soprassem minhas falas?
Não será assim.
E eu sei. Eu sempre soube.

Então, por que o espanto?
E esta tristeza de onde vem?
Passar concreto no vazio do peito é medicalmente indicado?

E vago por livrarias em busca do tal livro de respostas, calmamente, passando pelas mais variadas secções. Evitando, é claro, os de auto-ajuda. São óbvios e comercialmente nocivos. Alguém me contou. A auto-ajuda procuro na prateleira “Drama”.

E com este gosto de injustiça na garganta, o que faço?
Minha Vó indicaria um gargarejo de água morna com sal.
Cura tudo. Se não, uma colher de mel pra arrematar. Nunca falha.

Escuto o silencio.
Fiz perguntas demais.

- Sempre escutei que era anarquista.
 - Não era comunista? Retrucou outro.
 - Era algum “ –ista”.
 -Não, facista era o Tio. E o avô, adultero. A prima foi puta. E o cunhado ladrão.
 -Sem pai. Nem mãe. Sem eira. Nem beira.

Tranquei a porta. Da linha de lá, não me interesso mais.

Ainda estou curando meus ossos; quebrados em 45 lugares. De 20 metros de altura, no trapézio da vida, fiz duas cambalhotas perfeitas e me joguei no ar.... As mãos da minha dupla de numero não vieram.

Eu vi o chão se aproximar e fechei os olhos. A dor veio só depois que o efeito da adrenalina tinha passado. E o da morfina, ainda nada.

Em declaração a imprensa, minha dupla disse: “No comments”.
Sem comentar ainda, quando as luzes se apagaram, ela deixou escapar:
“Não trabalho com insolentes que querem brilhar mais do que eu. O Show é meu”.
Que assim seja. Mas seria pedir muito, a decência, de me avisar que o número, dessa vez, acabava diferente? Comigo no meu próprio sangue? Ou você não se lembra que o cartaz lá fora da tenda dizia: EXTRA EXTRA SEM REDES DE SEGURANÇA!!!

O desespero da audiência é ouvido. Alguns gritos, revolta.
-Tadinha caiu, e ela era tão boa.
-Se espatifou, melhor...
-Duro de ver. Gostava dela. Qual é o próximo número? O mágico?
-Não, a mulher barbada. Vou comprar pipoca pra este.

Nesse show de horrores e maravilhas já não quero mais pertencer ao menu.

A cortinha se fecha.





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